A inesperada demissão do primeiro-ministro e a convocação de eleições antecipadas para 10 de março de 2024 abriram — sem qualquer margem de dúvida — um ciclo de falta de governo em plenas funções que se estenderá talvez até finais de maio ou mesmo até junho de 2024 e o começo de um novo instabilidade governativa durante os meses ou anos subsequentes dado que é altamente improvável que das próximas eleições legislativas saia um governo de maioria e partido único ou, mesmo, um acordo parlamentar de longo alcance e abrangência.

Não cabe no objetivo deste texto debater as causas da presente crise nem a justiça ou injustiça das acusações que agora pairam sobre António Costa e o seu círculo mais próximo. Mas cabe lançar o debate sobre como podem os partidos responsáveis, moderados e centristas de Portugal trabalhar e mitigar ou até impedir a eclosão de uma turbulência que surge agora no pior contexto internacional possível.

Com efeito, a previsível instabilidade política que agora ameaça Portugal não poderia vir em pior altura: decorrem duas guerras com pesado impacto na Europa: na Ucrânia e na Faixa de Gaza. Em novembro de 2024, teremos eleições nos EUA e há uma forte possibilidade de vermos Trump regressar à Casa Branca. Outras crises esperam apenas a oportunidade para eclodirem, sendo o caso de Taiwan e a catástrofe climática que parece cada vez maior e mais urgente. Para responder a este pesado contexto Portugal — país quase sem recursos e muito dependente do estrangeiro — precisa de estabilidade e se esta já só muito remotamente poderá ser fornecida pela renovação de um governo apoiado por uma maioria parlamentar. Isto significa que precisamos de soluções alternativas:

a) Os dois maiores partidos: PS e PSD precisam de se entender e estabelecer um pacto de regime a, pelo menos, quatro anos sobre os sectores mais estratégicos da vida nacional e por esta ordem: Justiça, Saúde, Finanças Públicas e Educação. Questões como a Alta Velocidade e o novo aeroporto devem também estar incluídas, assim como a reforma do sistema democrático e a regionalização que aproximem mais os cidadãos do regime democrático e dos seus eleitos.

b) PS e PSD devem firmar o compromisso que, na falta de uma vitória de um deles por maioria absoluta, devem viabilizar os orçamentos que respeitem este pacto de regime. Nesta plataforma de acordo devem constar também e desejavelmente outros partidos não-populistas que obtenham representação na Assembleia da República.

c) Esta Plataforma de Acordo permitiria "centralizar" o regime e retirar espaço e campo de manobra e influência aos extremismos e populismos que sempre beneficiam nestes momentos de crise política e nacional.

d) Não se trataria de um "Governo de Bloco Central": um modelo de que, em princípio discordo e apenas é justificável em caso de severa emergência que coloque em risco a existência ou independência nacional, mas de uma plataforma mínima de entendimento que garanta o mínimo de estabilidade governativa a quem quer que saia vencedor das eleições de março de 2024.

Rui Martins | Eleito local em Lisboa pelo PS à Assembleia de Freguesia do Areeiro (Lisboa), dirigente associativo e fundador da Iniciativa CpC: Cidadãos pela Cibersegurança